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Vinte e cinco anos Da lida, do tanto, da vida de Christovam de Chevalier

event_note14/12/2024 12:47
Nos tempos de hoje, vinte e cinco anos de poesia podem passar num segundo diante dos olhos em perspectiva. Uma lista de livros, um verso marcante, uma imagem de sorrisos em um card de redes sociais que rolamos enquanto, desavisados, assistimos ao tempo escoar por entre os dedos. Mas não é isso que acontece quando se tem em mãos o livro Da lida, do tanto, da vida (7 Letras, 2024), onde o poeta Christovam de Chevalier celebra vinte e cinco anos de carreira literária. Não. Os versos tomam as rédeas do tempo. O tic-tac se transforma na cadência de palavras lapidadas que constroem uma teia de significâncias e imagens para lá de poéticas.

Manoel de Barros, no 11º texto de Fragmentos de canções e poemas (Poesias, 1947) diz “Aqui: ardo e maduro”. Esse verso diz muito de Christovam de Chevalier, apontado por Ferreira Gullar e Jorge Salomão como um dos nomes mais representativos da poesia contemporânea.

É um poeta do “Aqui”. Não foge para mundos imaginados, mas olha ao redor e segue de braços dados com seus companheiros, como seguia Drummond. Companheiros poetas, a quem dedica os versos de “da lida”, a primeira parte do livro em que reflete sobre o fazer poético, sobre a poesia que

“Não poupa esforços
e tenta de um tudo
repõe os destroços
do grito que é mudo.”
(Arte poética, pág. 25)


Os versos de “da lida” celebram amizades e longevidades, choram lutos, apresentam preces pela poesia perseguida. Mas não há pressa. Vive-se O tempo da poesia (pág. 37), que é geológico, lento.

É um poeta do “ardo”. Ardente. Assim se apresentam os poemas de “do tanto” , fogo que produz a combustão do oxigênio e nos deixa a perguntar

“Não sei quem me sufoca
me mata com seu ardor
se aprisiona na toca
me cala a febre e o calor.”
(Morada, pág. 41)


Arde a Saudade (pág. 45) :

“Ouço o estribilho
no escuro da casa
vislumbro teu brilho
no apagar da brasa.”



A ardência pode aparecer, também, nas inevitáveis desilusões que vida nos reserva, sempre, nos levando, por vezes, ao Distrato (pág.48) que nos deixa vermelhos de raiva:

“De ti nada quero.
Nem um abraço.
Há muito espero
o corte de laços.”


É com a intensidade dos versos que vemos que

“O poeta é
delicado
dedicado
decidido.”
(Fim de papo, pág.49)


É um poeta do “maduro”. Em seu livro Inventário de esperanças e outros poemas (7 Letras, 2021), se autodefine : “Sou um poeta lírico. Acho isso um barato.” O lirismo renegado pelos modernistas é ressignificado na obra Christovam de Chevalier que é poeta de seu tempo. Somente a maturidade adquirida nesses vinte e cinco anos dedicados à poesia pode nos legar um lirismo do tempo presente, sem renegar o passado, mas, sobretudo, sem ser ultrapassado, destino de todo futuro, como ensina o poeta Samuel Marinho. Não. Definitivamente. É um poeta de seu tempo e a tudo está atento.

Essa maturidade vemos na terceira e última parte do parte do livro: “da vida”, onde encontramos e paciência de um ourives a lapidar a palavra-joia. Aqui ouvimos muitas vozes e seus significados. Ouvimos A fala do homem (pág.72), do homem banguela, do vaqueiro, do homem brasileiro. A voz da Cigarra é poeticamente reverenciada (Uma voz como a dela, pág. 70). Há muitas referências musicais que dão um toque de requinte à obra poética, como Réquiem a Nelson Freire (pág. 83) . A vivência cultural do poeta permite pontes com diferentes universos, sem soltar a mão da realidade. Nesta parte final do livro encontramos A vida real (pág. 59) onde

“Não há
tela
maior
que a
janela.”


E nesta vida não há Controladores de voo (pág.67) para o “... que o sonho / ergue a partir de sua base”. A base da vida real é o sonho, como diz a música Vilarejo, dos Tribalistas. Ao Tribalista Arnaldo Antunes é dedicado o poema da abertura do livro, Um livro a ser escrito (pág. 21) , que dialoga com A casa , de Tom e Vinicius, pois esse livro é

“Sem miolo
ou margem
metrificação”


A maturidade no poeta é vista, também, a arquitetar construções sonoras. Não me contive e pus-me a ler em voz alta (Foto) síntese (pág. 86) .

O título do maravilhoso prefácio da grande poeta Flávia Souza Lima bem define que “Um poeta é um poeta é um poeta é um poeta” (pág.9). Christovam de Chevalier é um poeta. Junte tudo isso a uma edição primorosa da 7 Letras e você terá uma obra poética das grandes.

"Aqui: ardo e maduro". Eis o poeta.

Ainda em “da lida”, constata:

“Entreguei-me à lida da escrita.
Se fiz mal ou bem, eu não sei.
Sigo e persigo nesta desdita:
Perder o que se quer encontrei.”
(Constatação, pág. 35).


Feliz é um povo que pode encontrar a poesia que Christovam de Chevalier nos entrega nestes vinte e cinco anos de lida, de tanto, de vida de maneira que sua poesia existirá por um tempo de setenta vezes sete.
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